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O biólogo e apresentador televisivo Richard Rasmussen está sendo acusado de pagar pescadores para matar um boto rosa com o objetivo de obter imagens fortes para vídeos que foram exibidos no Fantástico. A acusação é do documentário A river below (Um rio abaixo, em tradução livre), do cineasta norte-americano Mark Grieco, exibido no Festival de Cinema de Tribeca, em Nova York.
O filme inicialmente acompanharia o trabalho do biólogo marinho Fernando Trujillo na Colômbia. O diretor decidiu trazer as gravações para o Brasil após assistir às imagens mostradas pelo Fantástico, em julho de 2014. A reportagem apresentou como pescadores caçavam e cortavam o boto rosa para utilizar a carne como isca na pesca de outro animal: a piratinga, um peixe valioso na região. Nas imagens, supostamente realizadas pelo biólogo Richard Rasmussen, uma fêmea grávida de boto é caçada e, ao ser cortada, se torna visível um pequeno feto formado, que também se torna isca para a pesca.
As imagens influenciaram o governo brasileiro, na época, a fazer uma moratória ambiental, proibindo a pesca da piratinga por cinco anos na região, com o objetivo de salvaguardar a sobrevivência do boto - mamífero em extinção. A medida, porém, também acabou afetando o ganha-pão de centenas de pessoas de comunidades ribeirinhas, o que atraiu a atenção de Grieco para as filmagens.
Em entrevista ao site Notícias da TV, Rasmussen confirmou ter participado da gravação, mas negou ter pagado os pescadores pela morte do animal. "Eu nunca pagaria ou mesmo participaria do sacrifício de qualquer animal. A matança dos botos é monitorada há anos por ambientalistas e já estava sendo investigada pelo Ministério Público. Minha intenção foi alertar o grande público que a matança de botos é uma realidade dura e cruel", declarou. "Quem tiver acesso às imagens perceberá a prática dos pescadores na captura e limpeza do boto. Não foi algo montado e também não era a primeira vez em que aquilo estava ocorrendo", continuou. Ele nega que as imagens tenham sido forjadas e argumenta que estava ali como representante da Associação dos Amigos do Peixe-Boi (Ampa), organização que atua na proteção dos mamíferos aquáticos da Amazônia.
Instigado pela reportagem, o diretor Mark Grieco se dirigiu à Amazônia em busca dos pescadores mostrados na televisão. Após uma investigação que durou meses, Grieco e sua equipe identificaram os pescadores e ouviram uma nova versão da história: a de que Rasmussen teria pagado R$ 100 a cada um deles para que reproduzissem, diante das câmeras, as práticas de caça ao boto.
A partir daí, surge o mote do filme: questionar até que ponto a ética ambiental pode ser confrontada na luta pela sobrevivência da espécie. "Que sacrifícios são aceitáveis na batalha por este animal em perigo e quais são as maiores questões sociais, econômicas e ambientais envolvidas?", indaga a sinopse da obra.
Em um primeiro momento de A river below, Grieco convida Rasmussen para falar sobre seu trabalho em defesa dos animais e o biólogo chega a criticar a postura de algumas pessoas no ativismo ambiental. "Não é o bastante. Precisamos fazer mais, precisamos de ações. Parem de falar e façam alguma coisa! Eles estão matando nossos botos, estão matando toda a nossa fauna. Matam rinocerontes, gorilas, tubarões. Eles... Nós matamos tudo, estamos destruindo o planeta. E ficamos de conversinha mole? Foda-se!", desabafa Richard em trecho do filme.
Em outro momento, porém, o biólogo - que tem passagens pelo SBT, Record e NatGeo - é confrontado sobre a acusação de pagamento ilícito para a morte dos animais. Grieco conta que, devido à proibição da pesca, famílias perderam a única fonte de renda e que o apresentador estaria jurado de morte na região. A partir daí, o filme mostra uma visita dele aos pescadores para um confronto sobre o ocorrido, que, segundo Richard, foi motivada pela transparência.
"Eu nunca pretendi prejudicar a comunidade e, por isso, precisava entender por que estavam 'me jurando de morte', utilizando as palavras do diretor do documentário. Eu sempre tive a confiança das comunidades por onde passei", justifica, em entrevista ao Notícias da TV.
Procurada pelo Viver, a assessoria de imprensa da Globo afirmou que a emissora não foi buscada pelo autores do documentário e não teve acesso à obra, mas que a denúncia teria sido realizada contra e biólogo e negada pelo mesmo. Em nota, a emissora se posicionou sobre o processo de apuração da reportagem. Leia o texto na íntegra:
"A TV Globo não foi procurada pelos autores do documentário e não teve acesso a ele. Como em toda a reportagem que coloca no ar, a Globo sabia quem era o responsável pelas imagens e tomou providências para checar a veracidade das informações. O material foi cedido pela Ampa – Mamíferos Aquáticos da Amazônia, e na gravação bruta, com o áudio ambiente, não havia nada que sugerisse qualquer irregularidade ou método ilícito na captação de imagens. Toda a estrutura em volta da captação e o comportamento dos pescadores mostravam que essa, para eles, era uma prática frequente, que desempenhavam com desenvoltura. Tanto a Ampa quanto o Instituto de Pesquisas da Amazônia viram as imagens e as validaram como legítimas. Tivemos o cuidado ainda de submetê-las ao Ministério Público Federal no Amazonas e fundamentar a reportagem em pesquisas do Instituto de Pesquisas da Amazônia, da UFRJ e da UERJ, que comprovaram, em amostras compradas nos mercados, que havia carne de boto rosa nas vísceras de piracatinga, peixe nocivo à saúde humana por conter altos níveis de metais pesados. Autoridades da preservação já indicavam, na época, que a população de botos estava diminuindo em 10% ao ano por causa da pesca da piracatinga. Para a TV Globo, a correção na apuração jornalística jamais é colocada em risco seja qual for a causa em jogo."
Confira a sinopse do filme:
"Nas profundezas da Amazônia, a população do golfinho de rio rosa indígena está diminuindo. Dócil e fácil de pegar, este animal quase mítico está sendo caçado à extinção e usado como isca para peixe. Mas dois ativistas estão cada um trabalhando incansavelmente para aumentar a consciência e proteger a espécie. Por um lado, um biólogo marinho e, por outro lado, uma famosa estrela de TV, cada um tem sua própria abordagem muito diferente para o seu objetivo comum. À medida que a batalha para salvar o golfinho rosa se intensifica, o esforço para direcionar a atenção do público para a questão torna-se cada vez mais difícil. Quando um escândalo explode, questões éticas são levantadas tão obscuras quanto as águas do próprio Rio Amazonas. Que sacrifícios são aceitáveis na batalha por este animal em perigo e quais são as maiores questões sociais, econômicas e ambientais envolvidas? O documentário surpreendente de Mark Grieco (Marmato) explora a ética do ativismo na era moderna da mídia."
Fonte:
Diário de Pernambuco