08/12/2015

Pesquisador gaúcho ganha prêmio internacional por iniciativa contra testes em animais

Este menino é um amor.... Viva esta geração que está mostrando ao que veio... Parabéns ao Róber!!!!
------------------------
Doutorando em biotecnologia, Róber Bachinski, 28 anos, recebeu R$ 30 mil

Em 2006, ao saber do fim reservado aos ratos do laboratório de biofísica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mortos após as pesquisas, o então estudante de Biologia Róber Bachinski, 21 anos, não pensou duas vezes: com o consentimento da técnica do laboratório e a ajuda de uma amiga, colocou 14 deles em duas caixas de sapato e tomou um ônibus para bem
longe da universidade.

Como se não bastasse, no mesmo ano, reivindicou judicialmente o direito de não frequentar as aulas que incluíam testes com animais. Venceu na Justiça, mas padeceu na academia. Hostilizado por colegas e professores, deixou a UFRGS para não mais voltar assim que pegou o diploma: foi cursar o mestrado na Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz).

Doutorando em biotecnologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), ele se tornou, na semana passada, o primeiro brasileiro a receber o Lush Prize, prêmio internacional que distribui anualmente cerca de R$ 1 milhão a projetos e pesquisas contra o uso de animais como cobaias. Aos 28 anos, o gaúcho foi o único não-europeu reconhecido na categoria Jovem Pesquisador. Como prêmio, além de uma lebre em cerâmica criada pelo escultor Nichola Theakston, recebeu cerca de R$ 30 mil, que serão investidos em um projeto focado no uso de métodos alternativos para testes nas universidades.

Natural de Santa Maria, mas criado na pequena São Vicente do Sul — município da região central com pouco mais de 8 mil habitantes —, ele vive sua filosofia às últimas consequências. Há 12 anos, não consome carne, ovos, leite ou qualquer alimento derivado de animais, nem produtos que tenham exigido algum sacrifício animal.

— Porto Alegre teve uma boa influência na minha vida. Foi onde eu comecei a ver que tinha mais pessoas parecidas comigo. Lembro da primeira vez que eu fui na feira orgânica da José Bonifácio e encontrei a banca da Sociedade Vegetariana Brasileira: foi um choque ver que existia gente igual a mim. Foi muito inspirador — recorda.

Atualmente, mora em Niterói (onde fica a UFF), que "não tem muitas opções" de comida vegana, mas onde deve seguir após a conclusão do doutorado, em 2015. Na quinta-feira, recém-chegado de Londres, onde ocorreu a premiação, bateu um papo via skype com ZH:

Como funciona o projeto que o premiou?
É um projeto chamado 1rnet, que tem como objetivo mapear os cursos universitários que usam animais e os que usam métodos alternativos, como eles os usam, e sugerir métodos alternativos adaptados à realidade brasileira. Há muitos professores, em várias universidades, que já substituíram suas aulas. Queremos entrar em contato com eles para replicar isso. Não é só uma questão ética, é uma questão de desenvolvimento científico.

Por que ele é importante?
É um trabalho de formação. Eu poderia ter enviado meu projeto de doutorado (para o prêmio), mas meu foco é trabalhar na formação de jovens pesquisadores. Pelo site, hoje, nós disponibilizamos bibliografia e alguns métodos. Nossos contatos também estão lá.

Como é o seu trabalho atualmente?
Hoje, eu trabalho com a criação de modelos tridimensionais para análise de toxicidade. Atualmente, esses testes são feitos em 2D. No projeto em que eu trabalho, buscamos utilizar células-tronco induzidas (a partir de tecido conjuntivo) para construir miniórgãos, que reproduzam partes do corpo humano onde se precisa realizar algum teste. É como trabalhar com o corpo humano em uma plataforma 3D. No Caat (Center for Alternatives to Animal Testing, da universidade Johns Hopkins), em Baltimore, onde fiz o sanduíche (doutorado sanduíche, quando o estudante passa um ano no Exterior), trabalhei em um projeto com agregados celulares de neurônios, o minibrain (minicérebro).

É possível acabar com o uso de animais em testes?
É uma pergunta dificil. Para o ensino, sim. Só se utiliza quando o professor não sabe como substituir, e queremos ensinar os professores a fazerem isso. Há várias possibilidades. Para a bioquímica, por exemplo, pode-se usar enzimas. Existem, ainda, métodos alternativos que trabalham com o cultivo celular para aulas práticas. Fora das universidades, existe um histórico de problemas éticos e ainda não temos tecnologia para tudo. Mas, daqui a 20 anos, vai haver uma revolução na ciência. Em 20 anos, os EUA não vão mais usar animais. O projeto Human on a Chip, mudará toda a ideia de experimentação, criando mini-ógãos em laboratório para trabalhar em conjuntos de testes. O Brasil tem que começar a pensar nisso agora. Tem professores que desqualificam (os métodos alternativos), porque é o interesse deles, estão defendendo seu currículo. Mas eles precisam começar a pensar nos alunos. Décadas atrás, os testes de gravidez eram feitos com sapos. Se perguntassem se era possível fazer de outra forma, as pessoas iam dizer que não. A ciência evolui.

Por que ainda há resistência a esses métodos?
As pessoas têm medo de acreditar que os testes em células ofereçam garantias para testes em humanos. Mas, em testes com animais, uma espécie prediz o resultado em outra em, no máximo, 60%. Se de um camundongo para um rato é isso, imagina de um camundongo para o humano! Hoje a gente já tem, para algumas coisas, condições de garantir a segurança dos humanos sem testar em animais. Com testes de células eu já consigo mostrar se a substância é tóxica ou não, por exemplo. Além disso, os animais sentem dor, têm necessidade de liberdade e de interação com o meio social. Eles não são seres éticos, mas nós somos. E eles têm interesses que devem ser mantidos pelos seres humanos, que são capazes de identificá-los. Os testes com animais não foram uma tentativa errada, à época que iniciaram. Foram a alternativa mais correta para avançar nas pesquisas. Mas hoje, precisamos avançar, por uma questão tanto ética quanto metodológica.

Como isso pode ser feito?
Existem, hoje, os chamados 3Rs: reduzir, que é limitar o uso de animais em testes, refinar, que significa melhorar as condições em que esses teste são realizados, e substituir (do inglês, replacement), mas esse último ainda não tem muitos investimentos. É a substuição que vai dar o avanço no plano moral e tecnológico.

Em 2006, você ficou conhecido por um episódio inusitado: levar os ratos do laborátorio da UFRGS. Como foi?
No laboratório de biofísica, tinha uma pesquisa que era feita com ratas prenhas. Todos os filhotes, assim como as mães, eram mortos. Quando soubemos, eu e uma colega fomos pedir pra não os matarem. A técnica do laboratório nos deu os ratos, mas eu não sei se ela tinha autorização ou não. Colocamos em duas caixas e atravessamos a cidade de ônibus. Depois começamos a procurar pessoas para adotá-los. Eu fiquei com quatro: o Um, o Dois, o Três e o Quatro. Eles eram iguais, então marquei os rabos com uma caneta para conseguir identificá-los. Mas, como os ratos de laboratório são frutos de cruzas que favorecem algumas doenças, os meus começaram a morrer uns três anos depois, com câncer de pulmão. O mais longevo foi o Três, que morreu com três anos e meio.

Por que você fez isso?
Muitos pesquisadores acham que podem fazer qualquer coisa. Mas a ciência tem de ter limite. No Brasil, a maior parte das universidades é muito boa cientificamente, mas falta a parte humana. A gente tem que fazer as duas coisas avançarem, promover a boa ciência com os alunos. A ciência não é um deus, a ciência não é a verdade e a ciência não está acima da ética humana.

Você veio para Porto Alegre para estudar, e acabou processando a universidade. Como foi a experiência?
Aos 12 anos, na cidade onde eu morava (São Vicente do Sul, na Região Central), a única opção que eu tinha era fazer escola técnica. Eu sempre quis estudar Biologia, então comecei um curso em zootecnia. Mas não sabia que se tratava de técnicas de manejo e abate de animais para consumo. Queria fazer o curso porque gostava de animais e, de repente, estava cortando orelha, rabo, dando injeção. Foi um processo de dessensibilização do qual não me orgulho. Mas consegui ver isso. Na Biologia (da UFRGS), foi a mesma coisa. Meus colegas não queriam fazer isso (os testes com animais), mas, dois semestres depois, estavam matando ratos. Precisamos trabalhar isso: evitar a dessensibilização. Um veterinário sai do curso achando que o animal é um objeto. O aluno precisa deixar a universidade sensibilizado. Hoje, eu não tenho pena dos animais. Trabalho com isso por uma questão de ética.

O que mudou de 2006 para cá?
Se o Róber de hoje olhasse o Róber de antes, ele teria um certo respeito por tudo o que aquele passou na faculdade... E também ia pensar que ele era um adolescente, com sangue quente, que discutia, que ia à luta, mas não tinha muito diálogo. Hoje, sou muito mais pacífico e acredito muito mais na colaboração e no trabalho em conjunto, que marcaram a minha formação.

Quais são os próximos passos?
Eu tenho um débito com a sociedade, que me apoiou de várias maneiras, e com o governo, que sempre financiou meus estudos. Quero incentivar outros estudantes, participar de congressos. Eu não tenho talento para ganhar dinheiro, então a ideia é transformar o 1rnet em um instituto, começar pequeno, continuar dividindo apartamento aqui (em Niterói). Mas estamos com abertura no governo e na sociedade para discutir novos métodos. Hoje o Brasil está muito atrás dos EUA e da Europa, mas estamos avançando muito rápido. Eu espero que continue avançando. E vai continuar.

FONTE: zh.clicrbs

Um comentário:

  1. Parabéns Róbe por sua dedicação ao tema. Que seu Doutorado siga triunfando e você continue destacando-se e trazendo paz, alento aos animais de laboratório, ou não.
    Meus aplausos a ti. De pé!

    ResponderExcluir

Agradecemos seu comentário, porém, não publicaremos palavrões ou ofensas.
Os comentários não representam a opinião do portal; a responsabilidade é do autor da mensagem.

EM DESTAQUE


RECEBA NOSSOS BOLETINS DIÁRIOS

Licença Creative Commons

"O GRITO DO BICHO"

é licenciado sob uma Licença

Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Não a obras derivadas

 

SAIBA MAIS


Copyright 2007 © Fala Bicho

▪ All rights reserved ▪